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sábado, 30 de junho de 2007

Metros e Fulanos

Não sabiam muito bem quando ou quem havia começado aquela rotina de olhares tortos. Quando um passava distraído, era o olhar do outro que chamava a atenção de volta. E como achavam chato viver sempre sob a mira de olhares tão indiscretos.

Dia sim, dia não, o casal de fulanos seguia com a sua rotina de casal. A rotina deles era apenas os olhares indiscretos e invasivos os quais tentavam disfarçar em vão, que iam gradualmente ficando mais intensos e incontroláveis. No resto do dia se questionavam o porquê daqueles olhares trocados entre dois desconhecidos. Ela pensava: "Até que é bonitinho". Ele pensava: "Ela deve me achar um psicopata". Ela achava um pouco disso, mas não podia ter certeza.

Eles tinham o incrível azar de sempre se encontrarem por aí, de cara surpresa, morrendo de medo de não se esbarrarem. Achavam que isso incomodaria ao outro. Reclamar dos olhares eles não podiam, mas de um esbarrão, quem sabe?

Completando um mês de relacionamento, quase como um presente da data, descobriram os nomes um do outro. Não mudou muita coisa. Mais um mês e se aproximaram o suficiente, contra as suas vontades, e puderam se escutar conversando com outras pessoas. As vozes eram bastante diferentes do que imaginavam: não eram espalhafatosas, depressivas ou sensuais. Eram comuns. Acharam estranhas para pessoas tão especiais.

A vida sexual do casal era bastante ativa. Fulana gozava em seus próprios dedos imaginando fantasias com Fulano, que por sua vez, jorrava tinta de caneta em poesias eróticas. Se masturbava pensando nela também, mas com menos freqüência com que escrevia.

Depois de três longos meses de relacionamento, Fulano começou a ficar com Marcela. Fulana nunca soube disso, mas mesmo assim notou que Fulano estava diferente. Seus olhares já não eram os mesmos e nem tão freqüentes como antes. As fantasias de Fulana perderam o encanto quando ela perdeu seus olhares. Fulano passou a escrever poesia sobre Marcela e sua nova paixão e agora já não precisava mais se masturbar.

Sem discussão ou drama terminaram o relacionamento. No final do mesmo ano, Fulana foi morar no nordeste, onde pode saciar suas vontades com um primo. Fulano começou a namorar firme. Algum tempo depois, ainda namorando com Marcela, sentiu que algo faltava na sua rotina, mas não sabia dizer muito bem o que era.

8 comentários:

Maria Joana disse...

Porque será que os amores platônicos, as fantasias descabidas, idéias sem braços, pernas, sem voz, ocupam assim tanto de nós?
Gostei desse novo estilo de texto.

Bruna disse...

Fulana e Fulano fazem muito sentido!

R. S. Diniz disse...

É, eles fazem muito sentido, e me lembram muito de alguém que eu conheço...

(lanark disfarça, olha pros lados...)




*cara, muitíssimo obrigado pelo seu comentário! e mais obrigado ainda pelas suas críticas! De verdade!

**Sexta-feira eu vou pra são paulo; quer beber comigo um dia desses? (eu marquei com dois amigos, um deles é dono de um blog também!)

Orange disse...

Eu sou um dos caras que vai beber com o Lanark!!!

e eu sou o 4º a apertar o botão!

e, e...

sei la, não sou mais muita coisa,

mas eu gostei do texto!

Bárbara Lemos disse...

Senti uma certa auto-biografia no ar? Ou estou apenas enlouquecendo, de novo. rs

Bisous.


Ps: O Narciso é sim uma referência explícita ao mito grego. A foto é minha, assim como o corpo e a tatuagem. As palavras fazem alusão clara à imagem.
Esclareci? rs

Anônimo disse...

ai essas paixões de ônibus e metrô, como fazem falta, e como dão ótimas histórias !

graças aos céus, as pessoas que eu convivo no percurso trabalho-faculdade-casa, de ônibus e trem não permitem olhares furtivos. se eu olhar, pelo contrário, é capaz de ser encontrada morta em qualquer canto da Zona Leste de SP. ô vida... !

obrigada pela visita :)
linkarei você também, eu adoro aqui.

Bárbara Lemos disse...

De fato, concordo contigo... também não sei separar-me por completo do que escrevo.

Ah, quanto ao Narciso (e eu juro que não imaginava que ia dar esse nó na tua cabeça), são sim dois personagens, um seria eu e o outro.. bem, o outro seria outra pessoa. Melhor assim? rs

MaxReinert disse...

opa.... ah... os olhares furtivos!!!... os encontros "quase" realizados... os relacionamentos que não vivi!!! ai, ai... (suspiro)!


Brigadão pela visita!!!!
[]'s